domingo, janeiro 16, 2005

POR ONDE ANDO...

I - Os livros que acompanham os dias presentes,
espalhados pelas horas que esperam por mim em lugares incertos.



Almas Cinzentas, de Philippe Claudel – uma sugestão de leitura que aceitei pela possibilidade de instantes de pensamentos partilhados. Ainda li demasiado pouco para poder emitir um juízo que não o interesse estimulado pela forma de contacto directo que o narrador estabelece connosco, talvez um dos atributos que tenham proporcionado ao autor o Prémio Renaudot 2003.

O Fio das Missangas, de Mia Couto – outra forma de fazer nascer palavras das mesmas coisas. Simples, com o encantamento que é reconhecido à escrita de Mia Couto.

Para Além da Morte, de John Galsworthy – leitura mais descontraída, embalada pelo realismo inglês, em pedaços que respiro quando nada mais parece apelar ao silêncio da leitura.

O Conceito de Amor em Santo Agostinho, da Hannah Arendt – não esquecendo que é uma dissertação de doutoramento de uma das maiores pensadoras do séc. XX, não deixa de ser uma delícia que poucos livros proporcionam, a erudição no feminino, delicada e profunda, exigente e livre. Um passeio inesquecível...

As Confissões, de Santo Agostinho – apesar de ainda só ter lido até ao livro VIII, até onde se descrevem ainda muitas das vivências anteriores à conversão e à entrega a Deus, é um dos textos que apetece beber até sermos capazes de dizer de nós mesmos aquelas verdade. Mesmo o impossível parece estar ao nosso alcance, ainda “sermos” homens e mulheres ao alcance do pensamento. Do mesmo autor, acabei na última semana o seu brilhante Diálogo sobre a Felicidade, que recomendo também.

História da Filosofia IV, de Nicola Abbagnano – um clássico que não tenho dispensado. Não o leio com o fim definido de preparar um exame, nem com o estímulo de conhecer a fundo os pensadores ocidentais, e não só. Tem sido uma leitura pela ajuda organizada e descomprometida que a sua linguagem de pedagogo dá na arrumação cronológica de eventos e homens, livros e revoluções no pensamento da humanidade. Acabei ontem (dia 15) o terceiro volume, aprendendo muito sobre a filosofia árabe e judaica, que tanto ensinaram ao Ocidente sobre Aristóteles, e tenho o quarto tomo a fazer beicinho por ainda não o ter desflorado. Apenas o marcador já dirige o seu lugar para Alberto Magno.

A Angústia da Influência, de Harold Bloom – tem sido um livro duro de fruir, um desafio, uma luta. Lembra-me de como me senti quando li a primeira vez a Obra Aberta. É daqueles livro que ainda sinto que se pode dar ao luxo de escolher o seu leitor, e tenta ironicamente chamar-me à sua leitura para me dizer devagarinho e com sadismo, que não sou ainda um leitor para si. Mas a minha teimosia por vezes é insensata. E tenho entrado no jogo. Leio, lentamente, como quem disfarça o desejo de o devorar, com medo de denunciar a ansiedade ou o temor de chegar depressa demais ao fim e sentir o gosto amargo de reconhecer que não devia ter lido ainda.




Rembrandt: Philosopher in Meditation (1632)


II - Impostos pelo estudo que a presente época académica intensifica, deixo-me perder ainda por:


Meditações Metafísicas, de Descartes – Depois das Regulae, e do Discours, as Meditações são uma leitura mais prazerosa. Não fosse o trabalho que tenho de fazer, o prazer seria ainda maior.

Categorias, de Aristóteles – já em fase final (de leitura, não de integração), é sem dúvida um grande texto, de interesse geral sobre a organização do pensamento e das coisas. Não tenho a certeza de estar a ler uma excelente tradução. Desconfio que não. Mas o apetite de continuar em busca da compreensão não é abalado por acidentes desta natureza.

O Conhecimento e o Problema Corpo-Mente, de Karl R. Popper – ainda comecei a ler antes do Natal, mas só agora me encontro com disponibilidade de continuar. Estou muito curioso para penetrar na justificação de Popper da função de chave-mestra que ele atribui ao seu Mundo 3.

Do Cancioneiro de Amigo, de Stephen Reckert e Helder Macedo – Cantigas medievais como significantes poéticos de significados antropológicos – um outro olhar sobre a imagética medieval, dos mitos e ritos que a nossa poesia de excepção permite sublimar em versos de aparente ingenuidade. Grandes ensaios e análises de texto.



III - Os livros de que nem me dou conta de andar a ler,
de tão naturais que são os minutos em que neles tenho repousado:



Teoria Literária, org. de Marc Angenot – ler devagar, tema por tema, problema a problema.

Dicionário das Ciências da Linguagem, de Oswald Ducrot e Tzvetan Todorov - referências incontornáveis da teoria literária e linguística

Source Readings in Music History: I. - Greek Views of Music – o Platão e o Aristóteles que ouviam música.

A Linguagem Harmónica do Tonalismo, de Christopher Bochmann - professor de quem guardo boas memórias, e cujo trabalho continua a ajudar-me a organizar as minhas aulas.

O Declínio da Idade Média, de quem não precisa de apresentações - Johan Huizinga é mestre na arte de fascinar, seja que esfera de pensamento for.

História da Literatura Portuguesa, de António José Sariava e Óscar Lopes – como o Abbagnano, leitura de longa duração, sem destino, sem pressa, ao sabor do tempo.

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