domingo, janeiro 16, 2005

pedaços de letras... de Philippe Claudel


Philippe Claudel

“Não sei muito bem por onde começar. É bastante difícil. Há todo esse tempo passado, que as palavras não recuperarão, e também os rostos, os sorrisos, as chagas. Mas ainda assim preciso de tentar dizer. Dizer o que me vai no coração há vinte anos. Os remorsos e as grandes interrogações. Preciso de rasgar o mistério à faca como um ventre, e de o remexer com ambas as mãos, mesmo se não mudar nada de nada.
Se me perguntassem por que milagre conheço todos os facto que vou contar, responderia que os sei, ponto final. Sei-os porque me são familiares como o entardecer e o nascer do dia. Porque passei a vida a querer juntá-los e alinhavá-los, para os fazer falar, para os ouvir. Outrora, era de certo modo o meu ofício.
Vou fazer desfilar muitas sombras. Uma delas, sobretudo estará em primeiro plano. Pertencia a um homem que se chamava Pierre-Ange Destinat”
(in Almas Cinzentas, Philippe Claudel, trad. Isabel St. Aubyn, ASA 2004)

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