segunda-feira, janeiro 31, 2005

crónicas de viagem

"Almas Cinzentas", de Philippe Claudel

Há lugares – espaço, tempo – onde a tristeza parece ter encontrado definitivamente o seu lar, o seu lugar.

Lírio-do-Vale, podias ter sido um corpo, uma vítima, apenas um corpo de menina, mais uma vítima, como o juiz Mierck fazia gosto em ressalvar nos gestos indiferentes e cruelmente frios, desumanos. Mas em épocas de morte anónima as mortes com nome inscrito doem numa dimensão diferente, à parte.
A tristeza apenas parece duvidar de ali pertencer, quando emigra para a nossa alma, também cinzenta no reflexo que a leitura nos imprime.

Philippe Claudel escreveu um livro triste - daquela tristeza bem intencionada que pretende acalentar sem iludir, daquela Tristeza com que Lysia cognominou o Procurador. Um livro sobre a herança dos instintos - uma herança pesada para quem deixa de ter outra vida que não essa para viver, outro destino que não aquele, traçado cedo demais. Lírio-do-Vale, Clélis de Vincey e Lysia Verhareine (para não acrescentar Clémence, que o próprio narrador hesita em colocar entre as restantes mortes), são os espelhos que devolvem à vida todo o cinzento que, já lá estando antes, se evidencia perante os vazios que estes nomes encerram com eles no túmulo. Mesmo assim, de todo o cinzento que habita o livro, as únicas cores vêm do passado relacionado com estas mulheres.
E não será sempre assim?

5 comentários:

Anónimo disse...

Presumi que ias gostar.Ainda bem.

Beijo, Q

Maria do Rosário Sousa Fardilha disse...

Às vezes as memórias da infância tb nos trazem algumas cores. uma das tuas está lá exposta (e aconchegada). bjs.

A. Narciso disse...

Despertaste em mim a vontade de o ler.
Abraço

Adónis disse...

das coisas que li até agora quase sempre me ficou uma frase..

desta vez:

«as únicas cores vêm do passado...»

quis lêr a crónica da tua viagem

Adónis disse...

Também escreves em dias de aniversário??

Bem.. o homem não para..

;)