domingo, maio 22, 2005

(dia 31 de outubro, 2041)

II

Nas ruas em que disperso o meu olhar pelas paredes e pelos telhados ...

“... I loafe and invite my soul ...”
(Walt Whitman)

e as pessoas parecem-me luzes que se procuram encontrar num escuro redentor. Desço e olho o rio, como que pela primeira vez. As tágides ainda não morreram ...
Olho para trás e espero um segundo de preciosa ansiedade. Por esta rua já desceram tantas pessoas, mas também tantas personagens, e era por ele que o meu pensamento ansiava, pois que nos seus derradeiros meses também ele, por interposta genialidade de José, procurou o seu eu/autor - e com ele, fantasma de companhia, morreu.


“Não sei de quem recordo meu passado
Que outrem fui quando o fui, nem me conheço
Como sentindo com a minha alma aquela
Alma que a sentir lembro.”
(Ricardo Reis)



Continuo a descer, agora que a emoção me escorre discretamente pela face, e atravesso a estrada, para virar naquela esquina, descer as escadas e parar sentado. Gostava que fosse noite, noite poética, noite dura, que cura. De noite este lamento seria ouvido, e por detrás da solidão, ouviria chamar o meu nome.

4 comentários:

Anónimo disse...

A solidão que vai corroendo corpo e alma..Morre-se a cada segundo. Fica a esperança da voz para quebrar o silêncio que dói.
Abraço

hfm disse...

Este texto tocou-me profundamente. Lê-lo foi quase um exercício de metalinguagem.

Amélia disse...

Belo o texto, Jorge!Beijo

musalia disse...

a solidão...porque se tem tanto medo dela? costumo dizer que é a amiga que nunca nos falha.

nem sempre conseguimos responder à voz que nos chama...quando nos chama...

beijos.