I
Pedes-me cinco sons
e os sentidos parecem
não ser capaz de evocar
um acorde temperado;
não consigo aniquilar
o ruído das preces
o arrulho de dores
da fé, a rugosidade
de tudo, a finitude.
Dou-te o medo, o
desajeitado medo de
quase nada, para que
com o branco brinques;
a cor do teu abraço
é escura já demais
para o vento que dizes
colher na túnica
dos profetas cegos.
Exiges o grito incerto
e não afino no parcial
harmónico que te doa,
que te quebre, magoe.
Cerras-me os olhos
com a força convicta
da unidade demiúrgica
com que os abriras;
esqueces a promessa
do infinito escuro
contido no deserto
em que as lágrimas
se vertem, desaguam.
Abro a garganta no
silêncio simulado
da oração hipócrita
com que te desgosto;
invoco todos os nomes
de impossibilidades
que te anunciem a dor
com que sucumbo
à realidade sem nós.
(in livro xiii)
Nota: este díptico, ainda em elaboração, de que é agora apresentada o primeiro poema da primeira parte, fechará o volume livro xiii, em contraponto com o tríptico para o Diabo que o tinha encetado, e que pode ser consultado nos arquivos.
r.e.
5 comentários:
hino ou lamento à condição de finitude humana?
beijos.
estou a gostar.Aguardo o II...beijo
Amarga e suave, sem contradições, é a sua leitura. Aguardo o II e realço:
Cerras-me os olhos
com a força convicta
da unidade demiúrgica
com que os abriras;
esqueces a promessa
do infinito escuro
contido no deserto
em que as lágrimas
se vertem, desaguam.
E se, ao invés, tudo ao Homem retornasse?
Suponho que seria o mesmo, porque é também do Homem que tudo parte.
Desamparo profundo, condição humana em espiral.
Também eu grito a esse Deus, cego, surdo, insaciável.
Que outra forma há de viver, que outra forma?
Esta é uma das mais lindas conversas com Deus.
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