IV
Levanto-me e a manhã sabe-me a cinza, a pó. Talvez seja da madeira do chão, do tecto, ou apenas de mim. Tenho frio. Ouço passos; estou sozinho. Ouço passos novamente. Sobre a cadeira a roupa remexe-se desalinhada, como que acordada de um sonho em que vestia um príncipe. Os passos eram dele, e agora que saiu, ajudo a roupa a encontrar-se consigo mesma, vestindo-a no meu corpo.
Olho para a janela fechada e penso vagamente na hipótese de nada existir para além dela... nem sequer o vazio. Aproximo-me da porta e esta limitação espacial irrita-me. Preferia Ser sem Espaço, ou pelo menos sem Forma, o que já seria suficientemente delimitador. Com um sorriso, ironicamente, a porta convida-me a sair ...
Aceito.
No corredor a ausência de plantas surpreende-me.
Regresso e penso ...
11 comentários:
tu nao sabes, mas adoro o teu blog...
*
acho q te vou mesmo assaltar :)
Soube a pouco.
As reticências amarguram e criam ansiedade. Ainda que continuar seja por vezes desesperante pois há toda uma eternidade para contar.
Será assim o futuro?
Espero que não!
(...)Mas diz-me... o tempo não tem uma sequência lógica. Isto é, não se apresenta numa linha cronológica certinha... ou as analepses e as prolepses são de propósito?
abraço da leonor
Engraçado...
A inexistência de 'nãos' não invalida a negatividade, o vazio, a ausência. 'Sente-se' no texto apenas o narrador, rodeado de nens e sens.
A ausência de plantas acentua o e penso vagamente na hipótese de nada existir para além dela... nem sequer o vazio.
Portas e janelas como marcos espaciais a contrastarem com Preferia Ser sem Espaço, ou pelo menos sem Forma.
Há um universo dentro da cabeça e não se está sozinho
PS- gosto destes. gosto destes.
Kiss
Belo texto, final magnífico!
Há textos que me sabem sempre a pouco... quero mais... e, mais...
Encontro-te em mim, nestes momentos solitários, em que quero sair, mas ninguém me abre a porta.
Tenho que a abrir sózinha. O corredor tem plantas, muitas plantas. Vivo nelas e para elas... mas regresso sempre. Regresso sempre, ao ponto de partida.
Abraço :-)
Um texto sobre um futuro de holocausto. Gostei muito.
Forte Abraço
O Hotel des Voyagers (Reggiani). os teus versos fizeram-me recordar essa canção. Por isso ela volta, ela volta sempre, os dois nunca conseguem despedir-se :-)
desajuste entre um tempo passado e uma realidade outra, súbita. daí o espanto da ausência das flores...
beijos.
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