III
eras a nuvem sob os castelos
de sombras e de palavras densas
que lia quando sonhava
a eternidade de cada lugar.
e eras a chuva que a desfazia
arremessando ameias e sílabas
para o abismo do passado,
para o negrume de qualquer vida
sem o horizonte ocultado
pelo teu vulto.
e eras o livro que se escrevia
com os silêncios nascidos
da chuva (
o mar cantava em polifonia
com outros silêncios
) e nessa escrita perdias-te
na hermenêutica da minha
presença.
eras o prado onde a chuva
dormia, onde cada gota
encontrava o meu olhar e
se tomava de sal.
e eras o refúgio de lágrimas
que não brotavam já
do mesmo céu.
e era belo o diálogo subtil
da chuva com os meus
mares, com os lagos onde
afoguei o lirismo, com os
charcos que mascaram as
rugas do meu tempo,
com os riachos por onde
descem sons e mortes –
mortes silentes e sons sem vida.
eras toda a água –
eras toda a água e
até no deserto
me esperas.
08.out.MMIX