um
os cavalos correm atrás da morte, levam-me
no seu resfolegar triste, conduzem
a minha sombra para debaixo
das ferraduras, sinto o peso decalcado em U
na minha voz, só eu
o sinto, não eles.
a minha melodia pesante avança
entre mim, os seus relhinchos e a arcada
tensa da morte.
trio de sombras e asas, duas asas e
uma sombra, duas sombras
e uma asa, liberdade
da luz e do vento.
é a morte que persegue
o som das ferraduras, é
o som do ferro na pedra
que me persegue, e não tarda toco
com os lábios a nuca invisível da morte.
Extensa Madrugada, Mãos Vazias
despojos do que vai sendo subtraído à obscuridade da morte
quarta-feira, setembro 23, 2015
segunda-feira, setembro 21, 2015
10.
uma vida em vão
um dragão vpador
uma dor inconsequente
um duende suicida
uma vida em vão
um cão infiel
um papel inútil
um vil inocente
um duende atleta
uma meta andante
uma amante esquecida
uma vida em vão
um concerto silente
um duende gigante
uma paleta incolor
um amigo indiferente
uma morte evitada
uma vida em vão
25.fev.13
uma vida em vão
um dragão vpador
uma dor inconsequente
um duende suicida
uma vida em vão
um cão infiel
um papel inútil
um vil inocente
um duende atleta
uma meta andante
uma amante esquecida
uma vida em vão
um concerto silente
um duende gigante
uma paleta incolor
um amigo indiferente
uma morte evitada
uma vida em vão
25.fev.13
quarta-feira, janeiro 01, 2014
in memoriam Inês Pereira (1995-2014)
um dia escrevi o teu nome assim...
Inventaste um lugar e da tua voz
Nasceu o hino, cântico nobre que
Entoas quando sonhas, dando cor ao
Silêncio que se curva sob os teus passos.
Povoaste esse recanto com ternura em flor
Elevaste toda a terra a poesia primordial
Recebeste todos os sons no teu olhar -
E em teu redor a felicidade assumiu a forma
Inebriante de um sol de pétalas infinitas,
Reflexos multicolores que anunciam a tua chegada -
Aurora que embala todas as madrugadas.
Hoje de ti me despeço com o teu nome na alma, com a tua luz que nunca me abandonará, querida.
Até sempre, 'Nês.
Inventaste um lugar e da tua voz
Nasceu o hino, cântico nobre que
Entoas quando sonhas, dando cor ao
Silêncio que se curva sob os teus passos.
Povoaste esse recanto com ternura em flor
Elevaste toda a terra a poesia primordial
Recebeste todos os sons no teu olhar -
E em teu redor a felicidade assumiu a forma
Inebriante de um sol de pétalas infinitas,
Reflexos multicolores que anunciam a tua chegada -
Aurora que embala todas as madrugadas.
Hoje de ti me despeço com o teu nome na alma, com a tua luz que nunca me abandonará, querida.
Até sempre, 'Nês.
segunda-feira, dezembro 30, 2013
sexta-feira, setembro 13, 2013
domingo, março 31, 2013
domingo, fevereiro 17, 2013
quarta-feira, agosto 29, 2012
quinta-feira, maio 24, 2012
domingo, abril 15, 2012
quinta-feira, março 08, 2012
terça-feira, novembro 08, 2011
o único oito do ano
Nem todos os dias a madrugada se adensa assim.
Nem todas as horas estas mãos se esvaziam tanto.
Hoje tudo parece mais inútil, mais estúpido.
Mesmo a dor, adormece inquieta.
Não grita, não se revolta.
Dorme.
Mas nada dorme dentro da dor.
Acho que nunca aprenderei a dizer-te adeus.
oito.xi.MMXI
domingo, agosto 14, 2011
segundo livro de orações
/sétima
pai, chegou o momento do choro
e do esquecimento do tempochegaram as míseras lágrimas que
te alimentam, que te sonham líquido
e te afundam o sentido
chegou, pai, o vento manso e quente
que lançaste um dia sobre a minha luz
e me queimou a liberdade de te escutar
pai, chegaram as notas daquela melodia
(lembras-te desse silêncio,
dessa melancólica melopeia que cantei?)
chegaram todas as notas num acorde
tremendo e luxuoso, trítonos sobre quintas,
quartas perfeitas sobre meios-tons de nunca
pai, o som veio buscar-me,
o trovoar das flautas, o ribombar dos
violinos imperiais, o restolhar dos tímpanos,
tudo às avessas numa orquestra muda
mas ainda assim, som
som onde adormeço quando te escuto
som de onde inspiro a morte
em pausas longas de tão breves
chegou o momento do choro
silente como no sonho que rezei, pai
chegaste, e aqui te reconheço
pela primeira vez
só, de novo
nu
onze: 08, MMXI
quarta-feira, agosto 10, 2011
segundo livro de orações
/sexta
é o dia eco do teu regresso
são os minutos reverberações
do teu pulsar calmo e apaziguador
são os anos o deserto
de todas as miragens que desenho
é o mês o rio que dos meus olhos
desce para o teu ventre e aí se evapora
são as horas ramos esguios de fantasmas
que a noite esboça se te não sinto
são os séculos planícies onde apascento
a alma que rumina sem fim
aninhadas em torno do teu cabelo,
o berço que te embala o regresso
são centelhas de morte
os batimentos da acelerada pulsação
quando de novo te dou à luz
sê para mim mais que o tempo
que choro e esqueço
são os minutos reverberações
do teu pulsar calmo e apaziguador
são os anos o deserto
de todas as miragens que desenho
sê para mim mais que o tempo
que conheço e inventoé o mês o rio que dos meus olhos
desce para o teu ventre e aí se evapora
são as horas ramos esguios de fantasmas
que a noite esboça se te não sinto
são os séculos planícies onde apascento
a alma que rumina sem fim
sê para mim mais que o tempo
que componho e destruoé o segundo o fulgor de te intuir
são os meses todos, todas as semanasaninhadas em torno do teu cabelo,
o berço que te embala o regresso
são centelhas de morte
os batimentos da acelerada pulsação
quando de novo te dou à luz
sê para mim mais que o tempo
que choro e esqueço
dez: 08, MMXI
terça-feira, agosto 09, 2011
segundo livro de orações
/quinta
não aceito essa noite que prometes
não caminhei até aqui para silenciar
o mar que os meus olhos despejam
quando adormeces
nem o teu beijo ácido e devorador
me compromete mais com a tua boca
nem com os teus braços que traem
a minha solidão
renuncio à brisa do teu arfar sobre
a minha madrugada - renuncio à
loucura de te beber o vento que
sinto nas veias
(porque te chamo se te afasto
porque te chamo se te amo
porque te chamo se me incendeio
porque te chamo se me odeio)
morreram as corujas em vão
para chegares à minha alma
e eu não estar lá para te matar
foi a lua ressonância do meu grito
será o dia eco do teu nascimento
nove: 08, MMXI
segunda-feira, janeiro 10, 2011
da) entre vi…
um dia disseram-me
: vida,
só uma!
nesse dia disseram-me outras mentiras
mas eu nessas acreditei –
com vontade, como
se crê em tudo o que sabemos falso
acreditei (bah…) que os pássaros morriam
e tudo à minha volta denunciava
o seu canto submerso
nos recantos das coisas inúteis
(sob as toalhas que cobrem
as mesas ridículas, camilhas e
afins, sobretudo as de imitação
barata, e que nem molduras com
fotografias mal tiradas levam
em cima
(atrás dos livros
demasiado novos para esconder
a magia que o meu olhar
discreto lhes confere quando
os desejo folhear de novo,
beber
(entre os
…
… que os pássaros tinham morrido…
pássaros que nunca voaram,
nunca! mas vivem ainda no sonho
que o seu canto imortal inspira
esses pássaros que morriam
(de mim, em mim, para mim)
recolhiam no bico lágrimas
como orvalho das minhas
madrugadas (lembras-te
do seu sabor?
) – mentiras salgadas
disseram-me que o amor
morria como os pássaros
e eu acreditei, e em todo
o lado o amor se revelava
como um garoto a brincar
às escondidas, inocente
na sua crença pura de
invisibilidade total
(o amor também julga
esconder-se, bah…
mas todos os lugares são
templo e caverna onde
se refugia
todos os sons, mensageiros
da voz que acalenta
a ausência (até o rouco
murmúrio do mar, ou o
desesperado grito de
deus, me trazem a dor
de te escutar, outra mentira…
sobre as vidas da vida, entre
a vida, sob a pele viva
da vida, vidas sem mapa, sem
origem nem fim, de todas as
vidas a vida, sobre essas
não! Morram os pássaros ou
o amor, continuem a morrer
até que o meu coração
desista de acreditar
na verdade.
dez: 01, MMXI
: vida,
só uma!
nesse dia disseram-me outras mentiras
mas eu nessas acreditei –
com vontade, como
se crê em tudo o que sabemos falso
acreditei (bah…) que os pássaros morriam
e tudo à minha volta denunciava
o seu canto submerso
nos recantos das coisas inúteis
(sob as toalhas que cobrem
as mesas ridículas, camilhas e
afins, sobretudo as de imitação
barata, e que nem molduras com
fotografias mal tiradas levam
em cima
(atrás dos livros
demasiado novos para esconder
a magia que o meu olhar
discreto lhes confere quando
os desejo folhear de novo,
beber
(entre os
…
… que os pássaros tinham morrido…
pássaros que nunca voaram,
nunca! mas vivem ainda no sonho
que o seu canto imortal inspira
esses pássaros que morriam
(de mim, em mim, para mim)
recolhiam no bico lágrimas
como orvalho das minhas
madrugadas (lembras-te
do seu sabor?
) – mentiras salgadas
disseram-me que o amor
morria como os pássaros
e eu acreditei, e em todo
o lado o amor se revelava
como um garoto a brincar
às escondidas, inocente
na sua crença pura de
invisibilidade total
(o amor também julga
esconder-se, bah…
mas todos os lugares são
templo e caverna onde
se refugia
todos os sons, mensageiros
da voz que acalenta
a ausência (até o rouco
murmúrio do mar, ou o
desesperado grito de
deus, me trazem a dor
de te escutar, outra mentira…
sobre as vidas da vida, entre
a vida, sob a pele viva
da vida, vidas sem mapa, sem
origem nem fim, de todas as
vidas a vida, sobre essas
não! Morram os pássaros ou
o amor, continuem a morrer
até que o meu coração
desista de acreditar
na verdade.
dez: 01, MMXI
segunda-feira, janeiro 03, 2011
segundo livro de orações
/quarta
espero pela noite que o teu beijo
apagou num sopro branco e lento
espero pela suavidade dos teus lábios
roçando os meus pensamentos
como uma amante dedicada e fiel
espero que a luz da noite que beijas
oculte a sede e a inquieta perda
dos sentidos e do sentido desta espera
anseio-te vestido de branco
adivinho o roçagar do teu olhar pelo
firmamento fora, como se houvesses
roubado o mapa da minha alma deserta
espero escutar o rouxinol transfigurado
de canto rouco e trôpego (trinado surdo
que a noite engole e regurgita com inveja)
- fosse minha a voz que escuto por detrás
da lua, fosse teu o espanto da coruja que
morre, fosses noite e beijo e vento agora.
dois: 01, MMXI
espero pela noite que o teu beijo
apagou num sopro branco e lento
espero pela suavidade dos teus lábios
roçando os meus pensamentos
como uma amante dedicada e fiel
espero que a luz da noite que beijas
oculte a sede e a inquieta perda
dos sentidos e do sentido desta espera
anseio-te vestido de branco
adivinho o roçagar do teu olhar pelo
firmamento fora, como se houvesses
roubado o mapa da minha alma deserta
espero escutar o rouxinol transfigurado
de canto rouco e trôpego (trinado surdo
que a noite engole e regurgita com inveja)
- fosse minha a voz que escuto por detrás
da lua, fosse teu o espanto da coruja que
morre, fosses noite e beijo e vento agora.
dois: 01, MMXI
quinta-feira, julho 22, 2010
segundo livro de orações
/terceira
ao vento que foge do escuro
exorto a que te guie até
mim sob o luar negro
peço-lhe que afaste do teu
caminho sombras e vultos
para que não confundas o
choro da minha alma
com o mal que a noite exala
exorto o vento que foge de mim
a que traga o teu cheiro
o aroma beatífico do teu cabelo
que acaricia os ramos mais altos
do bosque e o tapete de musgo
onde durmo quando te espero
se chegares antes do sol
trava o seu raio até o meu
olhar nascer para acreditar
na noite alva que trazes
para dentro de mim
quero uma noite eternamente
branca trazida pelo teu beijo
treze: 03, MMX
ao vento que foge do escuro
exorto a que te guie até
mim sob o luar negro
peço-lhe que afaste do teu
caminho sombras e vultos
para que não confundas o
choro da minha alma
com o mal que a noite exala
exorto o vento que foge de mim
a que traga o teu cheiro
o aroma beatífico do teu cabelo
que acaricia os ramos mais altos
do bosque e o tapete de musgo
onde durmo quando te espero
se chegares antes do sol
trava o seu raio até o meu
olhar nascer para acreditar
na noite alva que trazes
para dentro de mim
quero uma noite eternamente
branca trazida pelo teu beijo
treze: 03, MMX
segunda-feira, junho 21, 2010
segundo livro de orações
/segunda
sob o luar negro da tua
ausência choro em uníssono
com as corujas de olhar
em êxtase, quase místicas
sobre as pedras molhadas
de orvalho e frias pela
ausência demorada do sol
deambulo descalço e lento
como água que se cristaliza
sem quebrar a corrente -
lágrimas que secam pelo
teu rosto esfíngico abaixo
deambulo para ti à escuta
do restolhar que os teus
braços provocam nas nuvens
que te acolhem a alvura sombria
deambulo para ti alerta
ao vento que foge do escuro
e te anuncia em silêncio branco.
treze: 03, MMX
sob o luar negro da tua
ausência choro em uníssono
com as corujas de olhar
em êxtase, quase místicas
sobre as pedras molhadas
de orvalho e frias pela
ausência demorada do sol
deambulo descalço e lento
como água que se cristaliza
sem quebrar a corrente -
lágrimas que secam pelo
teu rosto esfíngico abaixo
deambulo para ti à escuta
do restolhar que os teus
braços provocam nas nuvens
que te acolhem a alvura sombria
deambulo para ti alerta
ao vento que foge do escuro
e te anuncia em silêncio branco.
treze: 03, MMX
quarta-feira, abril 21, 2010
segundo livro de orações
/primeira
não vieste ao meu encontro
quando caí
não caminhaste sobre a terra
para segurar a minha sombra
e sorver a seiva da minha
tristeza e descrença
não consumiste no fogo do teu
amor o meu amor por ti
não trouxeste anjos nem pássaros
nem ouro nem sarças nem naus
nem auras nem pão nem néctar
nem corpo de filho nem filho dos corpos
nem luz (
nada trouxeste que eu precisasse
para me escutar melhor (talvez os
pássaros, pai, mas...)
nem luz...
mas sob o luar negro da tua
ausência deambulo para ti
oito: 03, MMX
não vieste ao meu encontro
quando caí
não caminhaste sobre a terra
para segurar a minha sombra
e sorver a seiva da minha
tristeza e descrença
não consumiste no fogo do teu
amor o meu amor por ti
não trouxeste anjos nem pássaros
nem ouro nem sarças nem naus
nem auras nem pão nem néctar
nem corpo de filho nem filho dos corpos
nem luz (
nada trouxeste que eu precisasse
para me escutar melhor (talvez os
pássaros, pai, mas...)
nem luz...
mas sob o luar negro da tua
ausência deambulo para ti
oito: 03, MMX
segunda-feira, março 01, 2010
segunda-feira, fevereiro 08, 2010
sexta-feira, outubro 09, 2009
III
eras a nuvem sob os castelos
de sombras e de palavras densas
que lia quando sonhava
a eternidade de cada lugar.
e eras a chuva que a desfazia
arremessando ameias e sílabas
para o abismo do passado,
para o negrume de qualquer vida
sem o horizonte ocultado
pelo teu vulto.
e eras o livro que se escrevia
com os silêncios nascidos
da chuva (
o mar cantava em polifonia
com outros silêncios
) e nessa escrita perdias-te
na hermenêutica da minha
presença.
eras o prado onde a chuva
dormia, onde cada gota
encontrava o meu olhar e
se tomava de sal.
e eras o refúgio de lágrimas
que não brotavam já
do mesmo céu.
e era belo o diálogo subtil
da chuva com os meus
mares, com os lagos onde
afoguei o lirismo, com os
charcos que mascaram as
rugas do meu tempo,
com os riachos por onde
descem sons e mortes –
mortes silentes e sons sem vida.
eras toda a água –
eras toda a água e
até no deserto
me esperas.
08.out.MMIX
eras a nuvem sob os castelos
de sombras e de palavras densas
que lia quando sonhava
a eternidade de cada lugar.
e eras a chuva que a desfazia
arremessando ameias e sílabas
para o abismo do passado,
para o negrume de qualquer vida
sem o horizonte ocultado
pelo teu vulto.
e eras o livro que se escrevia
com os silêncios nascidos
da chuva (
o mar cantava em polifonia
com outros silêncios
) e nessa escrita perdias-te
na hermenêutica da minha
presença.
eras o prado onde a chuva
dormia, onde cada gota
encontrava o meu olhar e
se tomava de sal.
e eras o refúgio de lágrimas
que não brotavam já
do mesmo céu.
e era belo o diálogo subtil
da chuva com os meus
mares, com os lagos onde
afoguei o lirismo, com os
charcos que mascaram as
rugas do meu tempo,
com os riachos por onde
descem sons e mortes –
mortes silentes e sons sem vida.
eras toda a água –
eras toda a água e
até no deserto
me esperas.
08.out.MMIX
terça-feira, março 24, 2009
II
eras o mistério sem nome
a redenção de um delírio,
o universo de todo o peso
despido –
e eras vento colorido e breve.
e eras mais tu nesse tempo
imerso em imagens suspensas
do que em todas as horas
de vigília enganadora que
te arrastaram para o sonho
de antes, para o desejo de
agora, para o esquecimento
do futuro.
eras o lugar onde morri
antes de te esquecer e
onde decidiste guardar-me
para eternidades menos vis,
conservado no âmbar do
teu pensamento.
e eras a guardiã e o tesouro
porque a coisa amada
somos nós.
20.mar.MMIX
para azul
eras o mistério sem nome
a redenção de um delírio,
o universo de todo o peso
despido –
e eras vento colorido e breve.
e eras mais tu nesse tempo
imerso em imagens suspensas
do que em todas as horas
de vigília enganadora que
te arrastaram para o sonho
de antes, para o desejo de
agora, para o esquecimento
do futuro.
eras o lugar onde morri
antes de te esquecer e
onde decidiste guardar-me
para eternidades menos vis,
conservado no âmbar do
teu pensamento.
e eras a guardiã e o tesouro
porque a coisa amada
somos nós.
20.mar.MMIX
para azul
terça-feira, março 03, 2009
I
eras o vislumbre do vulto
imenso e antigo
que não iria chegar –
e eras a própria espera;
e eras mais bela nesse lugar
do teu silêncio do que
o tumulto apaixonado
que os pássaros sonhavam
cantar arrebatados quando
sobrevoavam os túmulos
anónimos dos meus amores.
e eras o fulgor dos lumes
crepusculares e pesados,
decalcados a sangue
sobre as infâncias todas
sobre as adolescências todas
sobre todas as vísceras do tempo –
e eras o esplendor desse lugar.
e eras o silêncio cavernoso
do coração inundado de resquícios
irreconhecíveis de amor –
parábola e hino, ao mesmo tempo,
à incessante melancolia sóbria
e líquida, pulsante no pensamento
atroz e voraz de cada êxtase
por esculpir.
03.mar.MMIX
eras o vislumbre do vulto
imenso e antigo
que não iria chegar –
e eras a própria espera;
e eras mais bela nesse lugar
do teu silêncio do que
o tumulto apaixonado
que os pássaros sonhavam
cantar arrebatados quando
sobrevoavam os túmulos
anónimos dos meus amores.
e eras o fulgor dos lumes
crepusculares e pesados,
decalcados a sangue
sobre as infâncias todas
sobre as adolescências todas
sobre todas as vísceras do tempo –
e eras o esplendor desse lugar.
e eras o silêncio cavernoso
do coração inundado de resquícios
irreconhecíveis de amor –
parábola e hino, ao mesmo tempo,
à incessante melancolia sóbria
e líquida, pulsante no pensamento
atroz e voraz de cada êxtase
por esculpir.
03.mar.MMIX
domingo, agosto 03, 2008
ou da luminescência involuntária dos graves
num tempo abrupto
rasgas o manto quieto e doce
invades a estepe de vento
poluis a essência das coisas então imunes.
atreves-te a sussurrar o mal
emerges do barulho do medo
afundas a dúvida no coração salgado de deus
resgatas depois deus com voz de anjo cínico e duro;
afastas de lugar seguro as coisas valiosas
para saborear o infindável travo a queda
inebriante, como luz psicadélica de tanto
pestanejar em noite de náufragos felizes.
atreves-te a invocar o mal
chamas um nome, outro nome,
outro, mas o mal não vem
não há caminho a calcorrear descalço
o mal é o mar todo em que a voz
se arrasta, medusa, anémona cega, bailarina
no azul esverdeado das almas rudes e graves;
quebras o lápis – refúgio dos pensamentos nocturnos -
e isolas o sentido da grafia e da fonética da dor.
atreves-te a guardar o mal
na redoma do teu íntimo útero de ferro
no casulo de uma crisálida gélida dentro do coração
atrás de um pensamento, debaixo do desejo, dentro [do vazio] do coração;
atiras ao ar a vida multicolor e aguardas
que a chuva ta devolva a preto e branco
como no inverno dos filmes, como nos sonhos
dos outros – nos teus o inverno é cinza vulcânica -
chovem rochedos leves, de esferovite, de brincar;
olhas a tua vida a ficar pequenina pequenina pequenina
como uma moeda ao ar que cairá sempre
de esquina, nunca perfeita, sempre de esquina;
olhas o pontinho lá longe a obrigar a fazer
caretas para o distinguir da imaginada esfera
que todas as vidas são quando se idealizam,
que nunca caem de esquina;
se fechas os olhos a vida cai como um
rochedo que já não é de esferovite mas,
como numa partida de carnaval ou daqueles
desenhos animados, deixa a tua silhueta recortada
na cova funda que abre ao cair-te em cima.
atreves-te a rir do mal
a escarnecer da violência, atreves-te a gozar
como um idiota com o sofrimento do mundo –
não de ti, do teu – do mundo, sim, do deles,
porque já não és um deles, já não és de ti,
não é já o teu mundo que cai, já não é teu;
o lirismo do mal abre uma fenda
na muralha do medo e deixa
escorregar por lá vermes e répteis em
vestes de príncipes bobos e cardeais;
amacias o sabor do mal com ritmos
convictos e palavras ambíguas, poéticas
como magma de alma, inúteis e
estúpidas como cristal tempo eu;
vertes sobre o poema o manto
elegíaco que escreveste para ti num dia
de sol qualquer, e perguntas-te
porque não secou ainda a tinta
e continua a tua vida a esborratar-se
como as cópias na primária ou os
bilhetes de amor escritos à pressa e
com o coração a fazer tremer o punho.
atreves-te a escrever o mal
num gatafunho, em língua nenhuma,
escreves coisas escuras em vez de
vogais abertas, escreves líquidos puros
em vez de mil sinónimos inúteis;
riscas o chão com a ponta do pé
num ritual que a infância aprendeu
misteriosamente, como se aprende a
tocar o corpo, como se aprende a
renunciar à vida, como se aprende a
aprender misteriosamente os rituais todos;
riscas primeiro uma linha, e sabes
que todos os universos têm um risco
mesmo a meio, que divide tudo
em partes diferentes;
o mal está sempre explícito na
parte maior de cada universo
mas a sua essência primordial
o âmago o fulcro a raiz
a sua definição mais límpida
espalha-se como veneno doce
na parte mais pequena, mínima,
insignificante, de todas as coisas;
o nosso pé pisa livremente
todas as linhas fronteiras traços
que se apagam e renascem adiante
fazendo pequenas as partes imensas
tornando monumentos as migalhas
de pão e os grãos de areia que a ventania
arrasta dentro de nós, em silêncio;
o mal ri-se do teu árduo esforço
em redesenhar riscos após riscos,
em apagar linhas e redimensionar
o que parece sempre igual, imutável,
obcessivamente neutro, como um
lírio de cristal, como uma borboleta
de bronze, como um amor de lume.
atreves-te a amar o mal
enrolas as tuas pernas nas suas
coxas, lambes o seu sexo pulsante –
o sexo do mal arde e goteja,
palpita arrítmico como um baterista
de jazz, às vezes como um louco,
outras como um sonâmbulo;
o sexo do mal recebe de ti
a força o calor o dilúvio
o ímpeto a lágrima a queda
a metamorfose, o sexo do mal
inspira-te suga-te absorve
o teu declínio como um néctar
feito do teu sangue – não tens
mais nada – absorve o ar que
expiras e não to devolve,
limpa-te o ego de todas as
vaidades absurdas, de todas
as glórias desonestas, enfim,
de ti e de tudo o que julgaste ser;
o mal ama-te até à noite;
o mal retribui o riso, o
amor, a palavra, a oração,
o murmúrio, o refúgio;
o mal devolve-te ao mundo
vomita-te cospe-te despreza-te
o mal não quer ser teu irmão
teu pai teu amante teu;
o mal renasce-te sem te morrer;
o mal faz um poema com os
teus escombros e lê-o à tua cabeceira;
o mal atreve-se a purificar
a essência das coisas
o mal atreve-se a acalmar
o vento que invadia a estepe
o mal atreve-se a remendar
laboriosa e apaixonadamente
o manto quieto e doce
rasgado num tempo abrupto.
para a marta, luminescências
doze: 07, MMVIII
rasgas o manto quieto e doce
invades a estepe de vento
poluis a essência das coisas então imunes.
atreves-te a sussurrar o mal
emerges do barulho do medo
afundas a dúvida no coração salgado de deus
resgatas depois deus com voz de anjo cínico e duro;
afastas de lugar seguro as coisas valiosas
para saborear o infindável travo a queda
inebriante, como luz psicadélica de tanto
pestanejar em noite de náufragos felizes.
atreves-te a invocar o mal
chamas um nome, outro nome,
outro, mas o mal não vem
não há caminho a calcorrear descalço
o mal é o mar todo em que a voz
se arrasta, medusa, anémona cega, bailarina
no azul esverdeado das almas rudes e graves;
quebras o lápis – refúgio dos pensamentos nocturnos -
e isolas o sentido da grafia e da fonética da dor.
atreves-te a guardar o mal
na redoma do teu íntimo útero de ferro
no casulo de uma crisálida gélida dentro do coração
atrás de um pensamento, debaixo do desejo, dentro [do vazio] do coração;
atiras ao ar a vida multicolor e aguardas
que a chuva ta devolva a preto e branco
como no inverno dos filmes, como nos sonhos
dos outros – nos teus o inverno é cinza vulcânica -
chovem rochedos leves, de esferovite, de brincar;
olhas a tua vida a ficar pequenina pequenina pequenina
como uma moeda ao ar que cairá sempre
de esquina, nunca perfeita, sempre de esquina;
olhas o pontinho lá longe a obrigar a fazer
caretas para o distinguir da imaginada esfera
que todas as vidas são quando se idealizam,
que nunca caem de esquina;
se fechas os olhos a vida cai como um
rochedo que já não é de esferovite mas,
como numa partida de carnaval ou daqueles
desenhos animados, deixa a tua silhueta recortada
na cova funda que abre ao cair-te em cima.
atreves-te a rir do mal
a escarnecer da violência, atreves-te a gozar
como um idiota com o sofrimento do mundo –
não de ti, do teu – do mundo, sim, do deles,
porque já não és um deles, já não és de ti,
não é já o teu mundo que cai, já não é teu;
o lirismo do mal abre uma fenda
na muralha do medo e deixa
escorregar por lá vermes e répteis em
vestes de príncipes bobos e cardeais;
amacias o sabor do mal com ritmos
convictos e palavras ambíguas, poéticas
como magma de alma, inúteis e
estúpidas como cristal tempo eu;
vertes sobre o poema o manto
elegíaco que escreveste para ti num dia
de sol qualquer, e perguntas-te
porque não secou ainda a tinta
e continua a tua vida a esborratar-se
como as cópias na primária ou os
bilhetes de amor escritos à pressa e
com o coração a fazer tremer o punho.
atreves-te a escrever o mal
num gatafunho, em língua nenhuma,
escreves coisas escuras em vez de
vogais abertas, escreves líquidos puros
em vez de mil sinónimos inúteis;
riscas o chão com a ponta do pé
num ritual que a infância aprendeu
misteriosamente, como se aprende a
tocar o corpo, como se aprende a
renunciar à vida, como se aprende a
aprender misteriosamente os rituais todos;
riscas primeiro uma linha, e sabes
que todos os universos têm um risco
mesmo a meio, que divide tudo
em partes diferentes;
o mal está sempre explícito na
parte maior de cada universo
mas a sua essência primordial
o âmago o fulcro a raiz
a sua definição mais límpida
espalha-se como veneno doce
na parte mais pequena, mínima,
insignificante, de todas as coisas;
o nosso pé pisa livremente
todas as linhas fronteiras traços
que se apagam e renascem adiante
fazendo pequenas as partes imensas
tornando monumentos as migalhas
de pão e os grãos de areia que a ventania
arrasta dentro de nós, em silêncio;
o mal ri-se do teu árduo esforço
em redesenhar riscos após riscos,
em apagar linhas e redimensionar
o que parece sempre igual, imutável,
obcessivamente neutro, como um
lírio de cristal, como uma borboleta
de bronze, como um amor de lume.
atreves-te a amar o mal
enrolas as tuas pernas nas suas
coxas, lambes o seu sexo pulsante –
o sexo do mal arde e goteja,
palpita arrítmico como um baterista
de jazz, às vezes como um louco,
outras como um sonâmbulo;
o sexo do mal recebe de ti
a força o calor o dilúvio
o ímpeto a lágrima a queda
a metamorfose, o sexo do mal
inspira-te suga-te absorve
o teu declínio como um néctar
feito do teu sangue – não tens
mais nada – absorve o ar que
expiras e não to devolve,
limpa-te o ego de todas as
vaidades absurdas, de todas
as glórias desonestas, enfim,
de ti e de tudo o que julgaste ser;
o mal ama-te até à noite;
o mal retribui o riso, o
amor, a palavra, a oração,
o murmúrio, o refúgio;
o mal devolve-te ao mundo
vomita-te cospe-te despreza-te
o mal não quer ser teu irmão
teu pai teu amante teu;
o mal renasce-te sem te morrer;
o mal faz um poema com os
teus escombros e lê-o à tua cabeceira;
o mal atreve-se a purificar
a essência das coisas
o mal atreve-se a acalmar
o vento que invadia a estepe
o mal atreve-se a remendar
laboriosa e apaixonadamente
o manto quieto e doce
rasgado num tempo abrupto.
para a marta, luminescências
doze: 07, MMVIII
quinta-feira, julho 03, 2008
livro de orações
/décima
meu amor de lume fresco
e claridade ardente
lírio pintado a sombras e
sepultado num bloco velho
meu delírio de sonâmbulo
vulto que projecto na noite branca
contra a luz do meu luar
meu amor inumano e
eternamente triste,
desnuda-me uma última vez
quero banhar-me no ácido da tua bondade
inventa para mim outra canção
que grite mais alto que a esperança
dilui-me no teu tempo à medida eterna
da imaginária morte antiga
leva-me a ver o mar de baixo para cima
enclausura-me num rochedo submerso e
canta luz para mim, difusa, difractada,
como os sonhos que ajudaste a apagar,
meu amor de lume fresco
e claridade ardente
lírio pintado a sombras e
sepultado num bloco velho
meu delírio de sonâmbulo
vulto que projecto na noite branca
contra a luz do meu luar
meu amor inumano e
eternamente triste,
desnuda-me uma última vez
quero banhar-me no ácido da tua bondade
inventa para mim outra canção
que grite mais alto que a esperança
dilui-me no teu tempo à medida eterna
da imaginária morte antiga
leva-me a ver o mar de baixo para cima
enclausura-me num rochedo submerso e
canta luz para mim, difusa, difractada,
como os sonhos que ajudaste a apagar,
meu amor de lume fresco
e claridade ardente
trinta: 06, MMVIII
quinta-feira, junho 12, 2008
livro de orações
/nona
tu, que desenhaste o meu epílogo a tinta da china
sobre uma tela pautada povoada de pausas
tu, que me insinuaste perguntas em tons de resposta
e me fizeste crer na infinita curiosidade
tu, arquitecta dos meus sonhos, poetisa da minha dor,
que me inscreveste no panteão negro dos caídos,
liberta agora o teu lirismo todo
e restabelece a minha ausência
não quero ser mais o personagem
dos teus dramas e tragicomédias
- quero o branco do céu
como cenário vazio
da minha translúcida
presença.
onze: 06, MMVIII
tu, que desenhaste o meu epílogo a tinta da china
sobre uma tela pautada povoada de pausas
tu, que me insinuaste perguntas em tons de resposta
e me fizeste crer na infinita curiosidade
tu, arquitecta dos meus sonhos, poetisa da minha dor,
que me inscreveste no panteão negro dos caídos,
liberta agora o teu lirismo todo
e restabelece a minha ausência
não quero ser mais o personagem
dos teus dramas e tragicomédias
- quero o branco do céu
como cenário vazio
da minha translúcida
presença.
onze: 06, MMVIII
terça-feira, abril 22, 2008
livro de orações
/oitava
senhora do sal, do marmóreo ventre, das rugas aveludadas
senhora das pedras graníticas sob o musgo espiritual
senhora do grave acorde do vento entre as ruínas, escombros meus
senhora do abismo, vertigem quente, arriba sem fim
vem ao encontro dos meus olhos cerrados
vem para as minhas mãos fechadas
vem rasgar-me a noite no peito
vem abrir ao meio o medo
grito com o corpo todo
estanque
vinte e um: 04, MMVIII
senhora do sal, do marmóreo ventre, das rugas aveludadas
senhora das pedras graníticas sob o musgo espiritual
senhora do grave acorde do vento entre as ruínas, escombros meus
senhora do abismo, vertigem quente, arriba sem fim
vem ao encontro dos meus olhos cerrados
vem para as minhas mãos fechadas
vem rasgar-me a noite no peito
vem abrir ao meio o medo
grito com o corpo todo
estanque
vinte e um: 04, MMVIII
domingo, abril 13, 2008
livro de orações
/sétima
voz de cascata vermelha e dura
entoa devagar o hino desse jardim
onde o meu olhar morto perpetua
o perscrutínio da vontade
timbre azedo e cremoso e branco
deposita no silêncio uma consonância
que se abra em flor busto vento e
ilumine o dia lilás antigo
confio no som, no nosso som,
no teu imponderável canto
sobre a minha terra ferida.
voz de cascata vermelha e dura
entoa devagar o hino desse jardim
onde o meu olhar morto perpetua
o perscrutínio da vontade
timbre azedo e cremoso e branco
deposita no silêncio uma consonância
que se abra em flor busto vento e
ilumine o dia lilás antigo
confio no som, no nosso som,
no teu imponderável canto
sobre a minha terra ferida.
doze: 04, MMVIII